Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO 

VOL. VIII, 2022

PSICOLOGIA SOCIAL E PRÁXIS INTERSECCIONAL: DESAFIOS FRENTE À TAREFA DE RECONSTRUÇÃO POLÍTICA DO PAÍS

ISSN 2965-226X

Trabalho afetivo: uma articulação entre a literatura científica e a arte 

Beatriz de Melo Silva (Universidade Federal do Rio Grande do Norte)

Resumo: Este trabalho surge a partir da construção de uma análise promovida por uma disciplina teórico-prática do curso de graduação em Psicologia, da Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi - UFRN. A partir das reflexões suscitadas pelas discussões em sala de aula e pesquisas bibliográficas, é perceptível que o trabalho configura-se como categoria central na vida humana. Dessa forma, alinhado ao ideário marxista, essa atividade passa, não mais a responder somente a satisfação das necessidades básicas, mas também a valorização do capital, tornando-se uma mercadoria. Com a ascensão do paradigma pós-moderno, apresentado por Hardt (2003), é possível perceber dificuldades para a concretização da dinâmica de trabalho em saúde, tal como um modelo biomédico instituído, pautado na objetificação da subjetividade e na medicalização do sofrimento psíquico, junto a esse modo de produção taylorista fundamentado nas relações intersubjetivas verticais e na estratificação do saber. Sendo assim, a compreensão da produção do trabalho imaterial, afetivo, vivo e servido de tecnologias leves, é visto também a partir das relações políticas e do biopoder atravessados pelo modelo econômico de geração do capital. Ademais, para que uma rede de cuidado afetiva possa ser estabelecida com eficácia, é necessário reconhecer o outro como um indivíduo biopsicossocial, uma vez que o trabalho afetivo relaciona-se aos determinantes sociais da saúde (DSS), à medida que esses fatores incidem sobre a situação de saúde de grupos e pessoas, como afirmam Buss e Filho (2007). Destaca-se nesse ponto a hierarquização estigmatizada do modelo biomédico como retardador da produção do afeto. Por isso, a produção de um trabalho afetivo enquanto dinâmicas que produzem e formam a sociabilidade e a sociedade, esteja relacionado a constituição e a produção de subjetividades coletivas (Hardt, 2003), é importante. Diante dessa discussão, as estratégias utilizadas para o desenvolvimento deste trabalho visam uma articulação interdisciplinar, por meio de um estudo qualitativo, entre as obras “O Trabalho Afetivo”, de Hardt (2003), “As redes de trabalho afetivo e a contribuição da saúde para a Emergência de uma outra concepção de público”, de Teixeira (2004), “A Saúde e seus Determinantes Sociais” por Buss e Filho (2007), juntamente com a canção “Laços” de Nando Reis. A partir do que foi vivenciado, aprendemos que o campo da psicologia, assim como em outras áreas, é produtor do trabalho afetivo e faz uso de tecnologias leves e leve-duras no cuidado e humanização. O cuidado é uma dimensão humana anterior a ciência e, na área da saúde, especialmente nesse período da pandemia, relaciona-se não apenas ao conhecimento teórico, mas também a aplicação do trabalho afetivo que, no dizer de Teixeira (2004), ao metaforizar a teoria de Espinoza, o primeiro encontro do paciente com o profissional da saúde, se positivo, estabelece uma relação de empatia, que é considerada um dos elementos essenciais para que o trabalho em saúde ocorra. Esse trabalho não se dá apenas por humanidade - como canta Nando Reis -, pois como discutido em Hardt (2003), apesar de imaterial, há uma agregação de valor na produção e, consequentemente, na prática profissional. Além disso, a partir da visão da prática do trabalho em saúde, do afeto e produção de subjetividades coletivas, é apresentado fatores que permeiam a maior parte de um ou mais grupos sociais, ou seja, vai além de uma medicina hospitalocêntrica e massificada, com atenção no coletivo, levando em conta o contexto em que está inserido a fim de prevenir, intervir, tratar e cuidar fazendo uso de tecnologias que potencializam a ação do trabalho vivo na saúde. Por fim, mediante as leituras feitas nos textos, os diálogos estabelecidos em aula e por meio da realidade que estamos inseridos, o trabalho em saúde deve ser visto como um esforço coletivo que envolve diversos agentes sociais que atuam na melhoria das condições biopsicossociais de uma população. Isto significa que, é preciso observar além da figura do médico, reconhecendo a participação dos diversos profissionais que, mediante os desafios para um trabalho humanizado, seguem na tentativa de estabelecer o que Nando Reis apresenta como “laços de ternura e aliança”. Compreendendo que o afeto, por mais importante que seja para a construção da relação usuário-profissional, não é um fator essencial para manutenção e criação da vida. Tendo em vista a importância do bom funcionamento das redes de trabalho em saúde que garantam o direito como apresentado na Constituição Federal de 1988 - de acesso com equidade às condições básicas de saúde, educação, infraestrutura, moradia, considerando que esses fatores influenciam na relação saúde-doença dos usuários. Sendo assim, é necessário pensar na criação ou reformulação das políticas públicas com vista ao tratamento, prevenção e cuidado das pessoas, dos espaços físicos, culturais e sociais, reconhecendo o sujeito e os determinantes sociais que o afetam, tendo a saúde como um direito sem o qual outros não existem.


Palavras-chave: Trabalho afetivo; Modelo biomédico; Determinantes sociais; Laços; Capitalismo.

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