Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO
VOL. VIII, 2022
PSICOLOGIA SOCIAL E PRÁXIS INTERSECCIONAL: DESAFIOS FRENTE À TAREFA DE RECONSTRUÇÃO POLÍTICA DO PAÍS
ISSN 2965-226X
As sutilezas da invisibilidade e do reconhecimento perverso da população negra no Brasil da cordialidade
Lwdmila Constant Pacheco (Universidade Federal do Ceará)
Resumo: Quando falamos de colonização tendemos a generalizá-la sobre todos os povos e territórios colonizados do mundo, porém, mesmo considerando que qualquer forma de violência é violência independente de avaliação de intensidade, grau e forma, como diria Fanon (2008), precisamos considerar as sutilezas que perpassam na nossa formação pretuguesa (GONZALEZ, 2020) aqui no Brasil. Fomos o último país a abolir a escravidão africana e pelo tempo da instituição e pelo contingente de escravizados negros que entraram no país nessa condição, fomos a nação mais dependente dessa forma de exploração. Fomos não, ainda somos, já que considero que a escravidão, assim como a colonização não se extinguiram com a lei Áurea de 1888 ou a independência do Brasil do jugo português em 1822, pois conseguir superar essas formas de socialização (trabalhista, classista, racial) precisa de mais que a assinatura de um documento oficial, precisa sim de anos, décadas, séculos de investimento na emancipação. A colonização brasileira foi marcada, dentro outras coisas, por uma forte miscigenação que tinha como estratégia o povoamento do vasto território nacional e a produção de mão de obra escrava ou barata na pós abolição. Apesar de sermos quase que todos mestiços (senão no corpo, na alma, como diria Silvio Romero no ano de 1888), absorvemos o ideal de civilização européia, o que faz com que se valorize a branquitude em todas as suas nuances em detrimento da negritude. Dessa forma, o racismo no Brasil possui a violência exata do extermínio, mas tem como característica cultural a expressão sinuosa do cotidiano pseudo cordial das relações interraciais. Onde se convive com as variações cromáticas epidérmicas, mas tendo dois padrões típicos de comportamentos nessa convivência: ou a negação da existência da negritude, onde os negros são invisibilizados e atravessados pelo olhar branco, ou o reconhecimento através do fetiche criado em cima da população negra que é abordada verbal e gestualmente de forma racista, mas o racismo é amenizado como sendo brincadeira ou uma informalidade afetiva de se relacionar. Se pensarmos a partir da ótica afropessimista (WILDERSON III, 2021), entenderemos que o racismo não é um defeito ou uma sequela da colonização escravocrata, é sim, uma base necessária da exploração capitalista e, mais que isso, uma referência que constitui o que é humano e não humano. Isto quer dizer que o ser humano é um constructo e não uma entidade orgânica, e para existir precisa de um Outro, e segundo essa concepção, o Outro Humano é o negro. Pensar sob essa ótica faz entender que o racismo não se iguala a nenhuma outra forma de exploração, pois todas as outras formas prevêem um ser humano sendo explorado por outro. Assim, a proposta aqui é refletir a partir da minha ótica – uma pesquisadora branca, sobre como se expressa a dialética do reconhecimento e da invisibilidade estratégica da negritude brasileira no intuito de demonstrar que o racismo se apóia numa ideologia que de tão naturalizada no cotidiano se torna sutil e imperceptível hegemonicamente, mas que sustenta e legitima formas escancaradas de violência e extermínio. Ressalto o meu lugar racial porque admito minhas limitações visto que, apesar de me debruçar sobre estudos raciais e tentar me manter atenta às distinções que concerne a raça no cotidiano, ainda assim, possuo resistências de auto reconhecimento frente a esse lugar de privilégio que ocupo. Trago reflexões que provavelmente não são novidades para o povo preto, mas que com certeza são recebidas com surpresa pelos brancos como eu, e sabendo que muitas vezes os brancos só ouvem seus pares, insisto em apontá-las mesmo correndo o risco de estar mexendo na ferida narcísica da branquitude, e nas dores óbvias dos negros.
Palavras-chave: Invisibilidade; Reconhecimento Perverso; Raça; Brasil; Cordialidade.