Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO 

VOL. VIII, 2022

PSICOLOGIA SOCIAL E PRÁXIS INTERSECCIONAL: DESAFIOS FRENTE À TAREFA DE RECONSTRUÇÃO POLÍTICA DO PAÍS

ISSN 2965-226X

Música, negritude e política: arte e resistência na produção musical de cantoras negras

Marcos Ribeiro Mesquita - Universidade Federal de Alagoas (UFAL)

Aline Cecilio da Silva - Universidade Federal de Alagoas (UFAL)

Áurea Cristinne da Silva Gomes - Universidade Federal de Alagoas (UFAL)

Milena da Silva Medeiros - Universidade Federal de Alagoas (UFAL)

Naricla Mariana dos Santos Batista - Universidade Federal de Alagoas (UFAL)

Resumo: Nas últimas décadas as lutas pela igualdade racial têm conquistado uma série de avanços que se dão tanto pela implementação de políticas públicas – especialmente com foco nas ações afirmativas –, pela postulação do debate acadêmico e político sobre o tema, cada vez mais cotidianizado; pela afirmação identitária que se expressa cada vez mais fortemente no âmbito da cultura, e ainda pela construção de um pensamento social que posiciona a questão racial como um elemento que estrutura a sociedade. Todas essas conquistas fortalecem sobremaneira a luta antirracista em diferentes espaços sociais. No campo da cultura, o debate em torno da questão racial tem se firmado como um elemento que tensiona, que questiona a insuficiência de políticas efetivas e contínuas de combate às desigualdades; que denuncia o racismo estrutural presente na sociedade; e que afirma a beleza e a potência da experiência da negritude. Na produção musical contemporânea, nota-se o crescimento de álbuns produzidos por pessoas negras e o fortalecimento de uma musicalidade que realça e constrói narrativas acerca de suas poesias, de suas vivências, ancoradas nas dores e lutas, mas também na satisfação e afirmação de serem quem são. É nesse contexto que percebemos a emergência de uma série de cantoras/es negras/os que trazem para o cenário artístico e musical, narrativas sobre a negritude: a denúncia das desigualdades, a força da resistência e o fortalecimento de uma perspectiva que não cansa em erguer a voz. Junto à dimensão da negritude trazem para o cenário musical questões como gênero, sexualidade, classe social, corpo, politica, etc. Assim, este trabalho teve como principal objetivo compreender como a discussão racial protagonizada por mulheres negras, na música brasileira, corrobora com a construção de narrativas plurais e contra-hegemônicas que compõem e disputam o significado de ser negra/o na atualidade. Nesse sentido, analisamos a produção musical de quatro cantoras negras, a saber: Bixarte, Jup do Bairro, Luedji Luna e Doralice. Elas integram a mais recente expressão da música popular brasileira em sua pluralidade de vertentes. Para a análise desta pesquisa foram escolhidas para as seguintes obras: “Revolução”, “Faces” e o single “Travesti no comando da nação” de Bixarte; “Corpo sem juízo” e o single “Sinfonia do corpo” de Jup do Bairro; Canto da revolução, “Pílula livre” e o single “Vamos derrubar o governo”, de Doralyce; e Um corpo no mundo” e “Bom mesmo é estar debaixo d’água” de Luedji Luna. No presente trabalho, orientamos nossa investigação a partir do uso teórico-político da interseccionalidade para compreender de que forma os diferentes marcadores sociais presentes nas narrativas presentes na produção musical destas quatro cantoras, produzem efeitos nas suas experiências de vida. O que está sendo proposto por essa perspectiva são ferramentas analíticas capazes de apreender a articulação de múltiplas diferenças e desigualdades, oferecendo recursos relevantes para compreender a produção de sujeitos na nova ordem global. Sobre os resultados da pesquisa, podemos afirmar inicialmente que a produção musical destas cantoras corrobora com a construção de narrativas plurais e contra-hegemônicas que compõem e disputam o significado de ser negra/o na atualidade. O fazem não só quando abordam as relações raciais em suas músicas e performances de palco, mas quando narram o cotidiano das pessoas negras em suas diferentes dimensões: das experiências em relação ao racismo, às alegrias de ser e de viver a negritude. As experiências relacionadas às vivências afirmativas e prazerosas da condição de ser negra/o, nos parece, um contraponto importante às imagens constantemente compartilhadas que associam o povo negro exclusivamente às dores e ao sofrimento. As experiências políticas e de resistência assumem também um lugar de visibilidade na produção musical das artistas. Ao falarem das dores e pesares, no genocídio da juventude negra, na violência estatal racista e policial que acontece especialmente nas favelas, elas assumem uma posição de denúncia; se posicionam, cantam e choram pelas agruras sofridas. Ao mesmo tempo, afirmam a política como alternativa. Músicas como “Travesti no comando da nação” de Bixarte, “A democracia” de Doralyce, “Luta por mim” de Jup do Bairro e “Saudação Malungo” de Luedj Luna, por exemplo, em suas diferentes versões e visões, apontam para as muitas possibilidades já existentes de resistências cotidianas construídas por coletivos, movimentos, comunidades. Essas resistências afirmam não só as experiências políticas existentes, mas também o diálogo potente entre os desafios do contemporâneo e uma ancestralidade presentificada nas práticas organizativas; a dimensão da espiritualidade como modo de supravivência e de existência; e a experiência de vivência dos bons afetos, dos afetos amorosos e de amizade. Por fim, destacamos a importância de analisar as produções musicais das cantoras escolhidas para esta pesquisa a partir da referência teórica e política da interseccionalidade. As análises interseccionais realizadas de suas músicas, permitiram o aprofundamento dos nossos estudos envolvendo epistemologias feministas negras, visto que consideram outros olhares sobre a construção de um conhecimento não hegemônico.


Palavras-chave: música; negritude; política; interseccionalidade.

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