Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO 

VOL. VIII, 2022

PSICOLOGIA SOCIAL E PRÁXIS INTERSECCIONAL: DESAFIOS FRENTE À TAREFA DE RECONSTRUÇÃO POLÍTICA DO PAÍS

ISSN 2965-226X

Revisão dialógica de literatura: a matriz sexo-gênero na formação em psicologia de Pernambuco

Arles Monaliza Rodrigues Nascimento (Universidade Federal de Pernambuco)

Benedito Medrado (Universidade Federal de Pernambuco)

Resumo: Neste trabalho, visamos discutir, a partir dos achados de revisão dialógica de literatura, de que modo a cisheteronormatividade tem se apresentado na formação profissional em psicologia. Essa proposta parte do pressuposto de que o sistema sexo/gênero e a cisheteronormatividade são elementos que fundamentam a formação profissional da psicologia no nosso país, com maior ou menor intensidade, a depender dos cenários e atrizes/atores envolvidos, nas mais diversas instituições, sejam públicas, privadas ou autarquias de ensino superior. Este pressuposto parte da análise da conjuntura histórica e social que situa a psicologia como uma ciência e uma profissão que dialoga ainda pouco com problemas sociais, tendo sido legitimada socialmente a produzir regimes de verdades, sobretudo no campo sexo/gênero, através de patologizações e dicotomias que produzem sofrimento, desigualdades e exclusões sociais. O projeto de tese a partir do qual este trabalho foi desenvolvido parte de uma postura pós-construcionista e da produção crítica do transfeminismo em psicologia social. Para a realização da revisão de literatura, adotamos os princípios e orientações da revisão dialógica de literatura. Diferente da revisão tradicional, que comumente produz uma mera reprodução do que tem sido produzido pelas/os pesquisadoras/es de determinada área de conhecimento, a revisão dialógica aposta nos encontros dialógicos que são possíveis a partir do encontro e da costura entre as/os diversas/es autoras/es. Esse diálogo é potente e produtivo, pois acaba por ser produtor de perguntas e problematizações acerca do que a pesquisa se propõe a discutir, delineando progressivamente e de modo mais compreensível o próprio objeto da pesquisa. A revisão dialógica de literatura propõe que a/o pesquisador/a tenha autonomia para selecionar as/os autoras/es que apresentam posturas epistemológicas e/ou teóricas que dialogam com a pesquisa em questão, além de propor que o tempo “gasto” com cada trabalho e o que incluir ou não na revisão de literatura seja uma escolha autônoma de cada pesquisador/a. A proposta, no entanto, não é livre de dificuldades, pois apesar de alguns programas de pós-graduação e/ou linhas de pesquisa, como o que estamos situadas/os, serem mais progressistas no campo científico, é difícil se livrar completamente das amarras dos regimes positivistas de produção de conhecimento que estruturaram historicamente a ciência. Um exemplo disso é que apesar das intensas leituras que orientaram os processos que envolvem a revisão dialógica de literatura, ao realizar as buscas em bases de dados, contraditoriamente, uma das preocupações ainda esteve excessivamente centrada na busca por termos que se apresentassem como descritores (com o objetivo de construir um padrão de resultados na busca, o que não dialoga com uma revisão dialógica). Sobre os achados da revisão dialógica, as principais problemáticas elencadas foram: a) a forte influência de dois grandes campos de produção de conhecimento na formação em psicologia, a psicanálise e a psiquiatria, com seus discursos normativos, binários e patologizantes sobre gênero/sexualidade; b) a invisibilidade de gênero/sexualidade nas matrizes curriculares dos cursos de psicologia, se concentrando, quando muito, em disciplinas eletivas; c) a inserção, quando presente, das discussões sobre gênero/sexualidade apenas nas disciplinas de psicologia social, o que reforça o descompromisso social da psicologia de modo mais amplo e o seu caráter individualista; d) a importância docente neste processo, pois o posicionamento ético-político dessas/es atrizes/atores serão cruciais para a presença ou não de discussões sobre gênero/sexualidade na formação em psicologia. A partir dessas análises, e dos diálogos costurados a partir das/os diversas/os autoras/es que produzem conhecimento neste campo, surgiram os seguintes questionamentos: qual a autonomia docente na formação em psicologia, visto que as/os seus/suas posicionamentos, sejam progressistas ou normativos, são tão cruciais para a formação de um/a psicóloga/o? Quais seriam as repercussões se de fato conseguíssemos ampliar a ótica “toda psicologia é social” na formação profissional em psicologia? E se todas as disciplinas da formação profissional em psicologia ampliassem sua ótica individual de análise e se interessassem/comprometessem com questões sociais como gênero/sexualidade? Estas foram algumas das perguntas disparadoras resultantes da revisão dialógica de literatura, que representam a potência e a importância desta, que diferente da revisão de literatura tradicional que acaba resultando em um amontoado de informações que não se articulam e funcionam apenas como instrumento comprobatório, é extremamente útil para construção de caminhos metodológicos e analíticos para pesquisas científicas.


Palavras-chave: Formação profissional; Psicologia; Sexo; Gênero; Cisheteronormatividade.

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