Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO 

VOL. VIII, 2022

PSICOLOGIA SOCIAL E PRÁXIS INTERSECCIONAL: DESAFIOS FRENTE À TAREFA DE RECONSTRUÇÃO POLÍTICA DO PAÍS

ISSN 2965-226X

Reflexões sobre a minha atuação profissional diante do recente Desastre Ambiental e Político em Pernambuco 

Diônvera Coelho da Silva 

(Universidade Federal de Pelotas / Universidade Federal de Pernambuco)

Resumo: Este trabalho visa relatar a minha experiência como psicóloga diante da recente crise ambiental e política ocorrida no estado de Pernambuco. Em março deste ano, saí do Rio Grande do Sul para realizar um intercâmbio nacional em Recife-Pe. Ao chegar na cidade, me deparei com a cultura popular que sustenta e encanta este lugar. Contudo, não imaginava que nos meses seguintes estaria envolvida no trabalho voluntário junto com psicólogas/os comprometidas/os em responder às demandas da crise ambiental que se instaurou na Grande Recife, em que 130 pessoas morreram devido ao deslizamento de barreiras (AGUIAR, 2022). Diante dessas circunstâncias pude fazer parte das equipes que atenderam os familiares das vítimas no Instituto de Medicina Legal de Pernambuco, tais atividades estiveram articuladas com o município, dado que nenhum trabalho foi realizado individualmente ou com pretensão assistencialista. Sabíamos que naquele momento, todos os serviços de saúde mental estavam sobrecarregados e nosso objetivo era atuar para diminuir os danos psicossociais provocados pela tragédia. Assim, formamos uma equipe de psicólogas/os que se dispuseram a atuar presencialmente e que tinham uma trajetória profissional em políticas públicas e na psicologia social e comunitária. É importante demarcar que não obtivemos nenhum recurso público para a realização do trabalho, contamos apenas com doações da sociedade civil. Assim, compartilho brevemente minhas experiências profissionais como psicóloga e professora, sobre a importância de uma ética amorosa na clínica e na sala de aula. Percebo a realidade social enfrentada em Recife-PE, ainda que eu não passe pelas mesmas dificuldades que a maior parte da população enfrenta. O estado de Pernambuco no ano de 2021, teve um aumento no índice da pobreza, cujo percentual foi de 8,14%, estima-se que cerca de 1,6 milhão de pessoas estão nessa condição, o que equivale a quantidade de habitantes da capital Pernambucana (NERI, 2022). Sabemos que nos últimos anos o estado brasileiro adotou uma política conservadora e neoliberal que naturaliza a violência, a fome e a desigualdade social. Neste sentido, o atual “Mapa da nova pobreza"" organizado por Marcelo Neri (2022) da Fundação Getúlio Vargas, revela que a maioria dos estados do norte e nordeste do Brasil possuem a maior parte da população em vulnerabilidade social, vivendo em condições de pobreza. A fim de romper com as desigualdades sociais e as variadas formas de exploração e humilhação humana, aliançada com o pensamento de Luiz Rufino (2021), proponho que o campo psi seja permeado por discussões sobre como gerar vida, e encantamento em meio às políticas de morte do nosso país. Para Luiz Rufino (2021, p.6), é preciso sair da condição de sobrevivente para supravivente para que sejamos capazes de driblar a condição de exclusão, deixar de ser apenas reativos ao outro e ir além, afirmando a vida como uma política de construção de conexões entre ser e mundo, humano e natureza. Neste sentido, também aposto no dispositivo amor, que para Paulo Freire e bell hooks são fios condutores para acabar com as opressões da nossa sociedade. Compreendo que foi o dispositivo Amor, enquanto ação política que me orientou a realizar um trabalho responsável e ético, foi o olhar racializado, sensível e atento a realidade que me fez conseguir entender que eu estava diante de um problema social, cujas raízes estão na miséria racializada que é cada vez maior no estado, dado a influência do sistema capitalista e do racismo ambiental. Chamo atenção ao fato de que os dados coletados pela Gerência de Análise Criminal e Estatística (Gace), Secretária de Estado de Segurança Pública, Corpo de Bombeiros, Defesa Civil dos Estados e Municípios, não registraram a identificação racial das pessoas vitimadas na tragédia, contudo, sabemos que a maior parte das vítimas fatais eram mulheres (AGUIAR, 2022). A partir dessa experiência em que pude atuar como psicóloga, compreendo a importância de tudo aquilo que bell hooks, Paulo Freire, Frantz Fanon, Lélia Gonzalez entre outras/os intelectuais, nos ensinam. Aprendo que a psicologia precisa ser efetivamente social e radicalmente amorosa. Eu não poderia fazer qualquer intervenção em saúde mental, se não tivesse a compreensão de que existe um projeto político de extermínio a tudo e a todos que não geram lucro, aos que não tem terra-lugar-lar, e que por isso, estão condenados à morte e às tragédias ambientais. Portanto, destaco a importância da atuação profissional ser voltada para a resolução dos problemas sociais e ambientais enfrentados pelas comunidades.


Palavras-chave: Atuação profissional; luta; raça, desastre ambiental, amor.

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