Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO 

VOL. VIII, 2022

PSICOLOGIA SOCIAL E PRÁXIS INTERSECCIONAL: DESAFIOS FRENTE À TAREFA DE RECONSTRUÇÃO POLÍTICA DO PAÍS

ISSN 2965-226X

Itinerários Terapêuticos de Saúde Mental em uma Comunidade Quilombola do agreste de Alagoas

Saulo Luders fernandes - Universidade Federal de Alagoas

Carolina Ventura Cavalcante Barbosa - Universidade Federal de Alagoas

Pétra Di Carlo Cavalcanti - Universidade Federal de Alagoas

Elane Santos - Universidade Federal de Alagoas

Hortêncio Cavalcante Ferro - Universidade Federal de Alagoas

Luana Cláudia Ferreira Magalhães - Universidade Federal de Alagoas

Ranielli Oliveira Barbosa - Universidade Federal de Alagoas

Resumo: A presente pesquisa se propôs a realizar um estudo de campo de cunho qualitativo e participativo com o objetivo de analisar as práticas de cuidado em saúde mental realizada no cotidiano pelos moradores da Comunidade Quilombola Poços do Lunga, localizada no município de Taquarana no agreste de Alagoas. Foram incluídas como população participante deste estudo as/os moradoras/es quilombolas residentes na Comunidade Quilombola Poços do Lunga com idade acima de 18 anos. Com base na pesquisa participantes e na relação cooperativa junto com a comunidade utilizamos do diário de campo, das conversas cotidianas e de entrevistas semi-estruturada para o mapeamento dos itinerários terapêuticos de saúde mental e as práticas de cuidado presentes na vida diária da comunidade. Foram entrevistadas/os 05 moradoras/es da comunidade dentre: lideranças comunitárias, mestre religioso, mestres de práticas populares de saúde e moradoras/es. A pesquisa foi realizada em cinco etapas: a primeira consistiu no levantamento bibliográfica; a segunda foi a produção de vínculo com a comunidade; a terceira etapa foram as imersões produzidas nos diários de campo e nas entrevistas; a quarta etapa buscou analisar as entrevistas semiestruturadas dos itinerários terapêuticos de saúde mental dos moradores por meio da análise de conteúdo por categoria temática, bem como, análises dos diários de campo. Na quinta etapa realizamos a devolutiva da pesquisa para a comunidade, profissionais e gestores de saúde. Na produção das análises construímos quatro categorias temáticas junto com as/os moradoras/es da comunidade: Identidade quilombola e saúde mental; Narrativa e oralidade no fortalecimento dos vínculos; Saberes populares e práticas de cuidado no quilombo; Relações com a natureza e processos de cuidado no quilombo. Nas conversas com os participantes emergiu que os processos identitários presentes no quilombo produzem ações políticas de afirmação da comunidade enquanto um território negro de resistência. Tal produção permite o fortalecimento das redes comunitárias e a identificação afirmativa com o lugar e suas práticas, principalmente as práticas ligadas a ancestralidade negra. Outro elemento que auxilia nos processos de saúde são as narrativa, a oralidade e as reminiscências que apresentam-se como um grande tecido que alinhava as vidas, as coletividades e as práticas diárias vividas na comunidade. Atua como expressão de uma pedagogia cotidiana que ensina dia após dia o modo de viver e cuidar do lugar e do território. A oralidade permite que uma multiplicidade de saberes circulem pela comunidade. Essa pluralidade de saberes se espraia também às relações entre os conhecimentos populares quilombolas e os acadêmicos como afirmaram as lideranças, como os saberes comunitários são importantes e são equivalentes aos saberes que os pesquisadores trazem como contribuição para a comunidade. Os conhecimentos populares de saúde transitam no território, são socializados na vida comum, apesar de também ter referências entre pessoas do lugar como mestres e mestras do cuidar. Quando os moradores ficam sabendo de alguma situação de adoecimento, fazem um movimento transmissão dos seus saberes seja pelo chá, lambedor, garrafada, reza, conselho, conversas de varanda. A relação coma natureza apresenta-se como outro elemento gerador de cuidado no território quilombola. Nas imersões e narrativas produzidas no pesquisar a natureza apresenta-se como parte integrativa da comunidade, parte de sua cosmovisão, e como sabedoria ancestral aprendida que oferece continuidade ao respeito à ciclicidade da natureza através das gerações. Um agir em conjunto com a natureza para produzir e reproduzir vida, pois os processos de vivência experienciados no quilombo acompanham os ciclos vitais do território e na relação com seus entes: animais, vegetais, encantados, rios, roça e a mata. Cuidar de si e da sua saúde mental é cuidar do próprio território como coextensão da vida partilhada como natureza. A pesquisa permitiu entender que os saberes produzidos pelas/os moradoras/es do quilombo, de diferentes formas, promovem o acolhimento do sofrimento e sua validação pelo processo do cuidado coletivo. O mapeamento dos itinerários terapêuticos de saúde mental possibilitou a identificação das vulnerabilidades vividas na rede de saúde mental nos territórios, bem como, identificou as práticas populares presentes no território para o cuidado em saúde mental. A pesquisa buscou por meio dos conhecimentos gerados visibilizar as práticas de cuidado presentes no território, como fonte potencial de alianças aos serviços e agentes de saúde para promoção da saúde mental territorializa e em diálogos interculturais em saúde. O quilombo não é apenas o local onde o povo quilombola vive e trabalha, mas sim um espaço que está permeado pelas entidades, divindades e espíritos dos que já se foram, formando territórios vivos, que transpassam a linearidade de tempo e espaço.


Palavras-chave: Psicologia Social; Saúde da População Negra, Comunidade Quilombola; Saúde mental.

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