Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO
VOL. VIII, 2022
PSICOLOGIA SOCIAL E PRÁXIS INTERSECCIONAL: DESAFIOS FRENTE À TAREFA DE RECONSTRUÇÃO POLÍTICA DO PAÍS
ISSN 2965-226X
Negros desde quando? grupo de estudos e aquilombamento em espaço universitário
Kennedy Robinson Alves da Silva Centro Universitário Doutor Leão Sampaio (UNILEÃO)
João Vitor Alves do Nascimento Centro Universitário Doutor Leão Sampaio (UNILEÃO)
Natália dos Santos Biró Centro Universitário Doutor Leão Sampaio (UNILEÃO/FACIBA)
Moema Alves Macêdo (UNILEÃO / UFPE)
Resumo: O presente escrito tem como objetivo relatar a vivência de um grupo de estudos intitulado: negros desde quando?, que se propôs a ler “Tornar-se negro”, da Neusa Santos de Souza. O grupo era vinculado ao Centro Universitário Doutor Leão Sampaio (UNILEÃO), no qual em virtude da pandemia os encontros foram realizados de maneira virtual. Assim sendo, o grupo nasceu do desejo de estudar autores negros em consequência de sua escassez na grade curricular acadêmica do curso de psicologia onde em sua maioria é eurocêntrica. Para desenvolvimento desse trabalho, foi feita uma roda de conversa com os autores, com base na reflexão: que relatos são possíveis a partir do grupo de estudo “negros desde quando?”, as contações relatadas foram anotadas e refletidas com base em livros e artigos científicos sobre a temática. O texto foi construído de modo compartilhado, com o intuito de apresentar os sentidos vividos por todos os autores. Trata-se, então, de um relato de experiência. Nas vivências dos encontros do grupo de estudo, alguns obstáculos foram percebidos como a não assiduidade. À medida em que os encontros aconteciam mostravam a evasão no número de pessoas brancas e a permanência de pessoas pardas e negras. A identificação entre participantes e as histórias contadas proporcionou que os ministrantes se emocionassem em alguns momentos. Era permitido que tanto os ministrantes como os participantes se manifestassem e apresentassem suas falas a partir de seus sentimentos, sendo destacado a presença de angústias, medos, atravessamentos, pertencimentos e dúvidas. Eram trazidas falas e expressões respeitosas por todos, propiciando um acolhimento e um espaço de aquilombamento. Embora muitas falas do livro trabalhado, Tornar-se negro da Neusa Santos, fossem dolorosas, um trecho que pode ser destacado que ressoou durante as conversas dizia: não tomo a negritude como uma causa, como uma bandeira política, mesmo porque não sou negro de todo: sou mulato, nato, no sentido lato, democrático, sou brasileiro (SOUSA, p. 64, 1990). Percebendo a resistência em identificar-se como uma pessoa negra, em decorrência das vivências permeadas pelo racismo estrutural, compreendeu-se que tanto uma fala mais incisiva quanto uma fala mais branda no diálogo sobre o racismo e a construção dele, pôde ter afetado os participantes, permitindo que saíssem de uma zona de conforto e fazendo com que refletissem suas experiências de vida. Este relato de experiência bem como o grupo de estudo teve como finalidade elucidar o quanto ainda faz-se necessário denunciar o racismo e difundir a identidade e vivências pretas, objetivando a conscientização mesmo com resistência, ainda que, tal qual Zumbi dos Palmares que em 1580 organizou o povo negro em territórios livres (ANDRADE; VELOSO. 2021) fazer, de tal maneira, a organização desses povos também na contemporaneidade, fortificando-os a fim de uma maior afirmação racial. À luz disso, a busca pelo conhecimento através de autores negros como a Neusa Santos, tornou-se essencial para esse resgate cultural e cessação do racismo. Não tão somente o negro ter o conhecimento de si mesmo em apropriar-se de sua cultura e valores, mas que os brancos sob seus privilégios da branquitude a se conscientizar, respeitar e buscar serem agentes ativos na acusação do racismo. Destarte, ao decorrer dos encontros, através das partilhas das experiências individuais de como o racismo apresentava-se para cada participante, construiu-se um espaço de acolhimento e para além da discussão teórica, o aquilombamento, primeiramente uma herança deixada pelos os povos africanos e não apenas como território físico, mas também como simbologia, ideia, inspiração e sistema de valores combinados para a resistência e formação de uma identidade étnica (ANDRADE; VELOSO, 2021, pg.175). Para mais, tal construto permitiu que os participantes (em sua maioria pretos) se identificassem e se sentissem pertencentes ao espaço de negritude a fim de se perceberem como uma forma de ser e estar no mundo, com seus semelhantes. Desta maneira, a partir da problemática destacada, acerca da escassez de autores negros na formação acadêmica, o grupo de estudo possibilitou o encontro de pessoas pretas com pensadores e literaturas que elucidam vivências pretas e a emancipação de possuir um discurso e construír narrativas sobre si mesmo. À vista disso, em encontros quinzenais, questões filosóficas embasadas pela experiência de vida fortificaram os atravessamentos e deram contorno para as discussões com algumas questões disparadoras, tais quais: Negros desde quando? de que maneira você se percebeu enquanto negro? qual o peso de reafirmar-se enquanto negro em uma sociedade de extremo racismo? foi possível construir um vínculo afetivo de reconhecimento de demandas e histórias de vida parecidas, aproximando da explicitação de Andrade e Veloso (2021) aquilombar-se ser uma forma de vida que agrega a reconexão com a ancestralidade e o desenvolvimento de ambiências interacionais que propiciem a existência dessas pessoas autonomamente.
Palavras-chave: aquilombamento; negritude; formação acadêmica; racismo; grupo de estudos.